Velhas e novas direitas religiosas na América Latina
Os evangélicos como fator político
Nueva Sociedad Novembro 2015
Nota: Tradução de Carmen Carballal. A versão original deste artigo em espanhol foi publicada
em Nueva Sociedad No 254, 11-12/2014, disponível em www.nuso.org
As expressões politicamente conservadoras do movimento evangélico na América Latina ganharam notoriedade nos últimos anos, especialmente em sua persistente luta – em parceria com a hierarquia católica – contra a descriminalização do aborto e o casamento igualitário. Até agora, grande parte da análise social concentrou-se mais em descrever esse fenômeno do que compreender qual é a sua dinâmica. Foram feitos alguns esforços para estudar seu discurso1 e sua identidade2, mas o que domina é o tom descritivo.
O propósito deste artigo é avançar na compreensão: a) dos processos históricos que moldaram esta presença evangélica conservadora em espaços públicos; e b) da forma pela qual os atores religiosos estabelecem um «cosmos sagrado» e como esta construção é a base para assumir posições políticas. Diz-se que as posições dos evangélicos politicamente conservadores têm sua base em processos de construção do seu «cosmos sagrado», gerando neles afinidades com discursos refratários à mudança social.
Ao tentar oferecer uma visão panorâmica sobre as posturas conservadoras no movimento evangélico latino-americano, é inevitável uma perspectiva um tanto esquemática que simplifica as nuances e as complexidades do fenômeno. Entretanto, recorre-se a esta perspectiva com o objetivo de facilitar uma primeira aproximação global a essa problemática.
A longa presença evangélica em espaços políticos da América Latina
De forma esquemática, é possível distinguir quatro etapas da presença evangélica em espaços políticos da América Latina: a) a luta pela liberdade de consciência no final do século xix e início do século xx; b) a polarização ideológica nas décadas de 1960 e 1970; c) a emergência de «partidos políticos evangélicos» na redemocratização dos anos 80 e 90; e d) os movimentos «pró-família» e «pró-vida» de início do século xxi.
A luta pela liberdade de consciência no início do século xx. Com um caráter marcantemente liberal, o protestantismo do final do século xix e início do século xx envolveu-se na luta pela separação entre a Igreja católica e o Estado e pela liberdade de consciência. Através da imprensa, importantes representantes evangélicos tomaram a palavra no debate sobre o Estado laico. Em uma parceria com os partidos liberais no poder, ajudaram a limitar a influência da Igreja católica e a eliminar alguns dos seus privilégios jurídicos3. Nesses anos, os setores que aderiam ao protestantismo eram principalmente os segmentos sociais em transição: pequenos comerciantes e artesãos, profissionais liberais e imigrantes europeus4. O tradicional cosmos sagrado católico, herdeiro da Colônia, não dava mais sentido às suas relações econômicas e sociais mutáveis. Assim, eles encontraram no protestantismo a oportunidade de dar um novo significado religioso ao seu mundo por meio de dinâmicas de racionalização e individualização de acordo com a sua inserção competitiva nos mercados urbanos.
As igrejas protestantes precisavam de espaços culturais, legais e políticos que permitissem ao indivíduo maiores liberdades em suas opções não somente religiosas, como também econômicas e sociais. E não foi por acaso que estas demandas se projetaram no âmbito público e no debate político de então, apontando para um Estado laico. Durante esses primeiros anos, a presença evangélica em espaços políticos pode ser caracterizada, em termos gerais, como «progressista».
A polarização ideológica das décadas de 1960 e 1970. As igrejas evangélicas na América Latina não ficaram alheias à polarização ideológica dos agitados anos 60 e 70. Embora um pequeno segmento tenha se comprometido com a luta pelos direitos humanos e pelo socialismo, contribuindo para o desenvolvimento da Teologia da Libertação, a maioria assumiu uma postura passiva e legitimadora das ditaduras de então5.
A inicial industrialização da América Latina após a crise dos anos 30 e até os anos 50 e 60 teve duas consequências que nos interessam: por um lado, ampliou as classes médias; por outro, promoveu uma maciça migração rural para as cidades6. Esses vastos setores sociais em transição precisavam de novas bases interpretativas que dessem sentido às suas mutáveis condições de vida. Neste contexto, as igrejas evangélicas se multiplicam7. Nelas, do cosmos sagrado baseado na liberdade individual do protestantismo liberal de início do século xx se passa, por um lado, à construção de um cosmos centrado na obediência, na ordem e na disciplina (em estratos urbanos empobrecidos) e, por outro, a um cosmos festivo e efervescente em busca de reconhecimento (principalmente entre imigrantes rurais que engrossam o crescente movimento pentecostal)8.
Estes espaços religiosos, cujos integrantes desenvolvem predisposições de trabalho e disciplina que os ajudam a se integrarem ao mercado de trabalho, promovem também uma postura «passiva» ou «desinteressada» na «política»9, ou seja, uma atitude de não confrontação com o poder político e econômico. Proliferam, então, discursos religiosos de «obediência às autoridades» e de «trabalho responsável». Em sua grande maioria, a partir da passividade, as igrejas evangélicas aceitaram os regimes militares de então como sendo a melhor opção.
Redemocratização e partidos políticos confessionais nos anos 80 e 90. A redemocratização e a «década perdida» dos anos 80 se entrecruzam na América Latina. A crise econômica resulta em instabilidade profissional, familiar e, portanto, existencial10. Milhares de pessoas entram para as igrejas evangélicas, principalmente, com uma orientação emotivo-efervescente de caráter comunitário (pentecostais) ou de caráter individual intimista (neopentecostais). A motivação central para a entrada nestas comunidades de fé é «recuperar» a estabilidade emocional e manter «unida» a família tradicional (nuclear, heterossexual e patriarcal), ameaçada pelas mudanças sociais e culturais de final do século11.
Enquanto isso, os sistemas de partidos políticos se consolidam como uma mediação institucional entre o Estado e a sociedade civil. Por um lado, os novos convertidos evangélicos, especialmente as classes altas, acostumadas à atividade política, formam partidos que se apresentam perante a sociedade como «a voz dos evangélicos» (mas, em geral sem votações significativas) ou organizações sociais como a Federação de Indígenas Evangélicos no Equador. Por outro lado, o voto evangélico de setores populares serve para consolidar relações clientelistas entre atores políticos e líderes religiosos e incluir representantes nas listas de diversos partidos, como no Brasil, Peru ou Guatemala12. Neste contexto, tende-se a instrumentalizar o apoio eleitoral evangélico a favor dos interesses mais diversos.
Movimentos «pró-vida» e «pró-família» no início do século xxi. A construção de cosmos sagrados orientados à estabilidade/segurança, como resposta às situações de desintegração social e familiar de final do século xx, gerou uma atitude de resistência à mudança em vários agrupamentos evangélicos do início do século xxi. As estruturas de plausibilidade, ou seja, os contextos relacionais que permitem um cosmos sagrado estável e ordenado, são basicamente hierárquicas, tanto nas famílias como nas comunidades religiosas. Neste contexto, as propostas para ampliar a promoção e o respeito dos direitos sexuais e reprodutivos, principalmente o reconhecimento legal das famílias homoparentais e a descriminalização do aborto, são percebidas como uma ameaça direta à família tradicional13. Assim como na Igreja católica, no âmbito evangélico se formam movimentos «pró-vida» e «pró-família». Estes não procuram mais uma representação política evangélica como na etapa anterior; tentam, antes, pressionar os atores políticos para rejeitar o que chamam de «agenda gay» e de «ideologia de gênero»14.
Conversões e cosmos sagrados
Peter Berger chama de «estruturas de plausibilidade» os contextos vitais que servem como suporte social para que as comunidades religiosas construam cosmos sagrados. Estes cosmos são estruturas simbólico-discursivas (subjetivas e objetivas) que permitem que a pessoa dê sentido à sua existência cotidiana. Fazem referência ao sagrado e transcendente como fator último que explica a «ordem das coisas» (cosmos)15.
Aqui sustentamos que, para compreender as posturas políticas dos evangélicos na América Latina, é necessário estudar primeiro como constroem cosmos sagrados específicos e em quais contextos relacionais o fazem. Uma vez entendida esta «base da experiência religiosa», será possível discernir suas posturas políticas subsequentes. Para tal efeito, é necessário analisar quatro dinâmicas da experiência religiosa evangélica: a) processos de conversão; b) estruturas de plausibilidade (ou relacionais); c) universos simbólicos; e d) orientações políticas.
Os processos de conversão permitem entender a articulação entre a) condições socioeconômicas e culturais e b) estruturas relacionais de produção de sentido16. No fundo, toda conversão ocorre a partir da inadequação de estruturas simbólico-religiosas tradicionais, que não podem mais dar sentido a novas condições de vida. A conversão é, então, uma migração, ou mais propriamente, um processo de formação de novas estruturas simbólicas que possam dar sentido a estas emergentes condições socioeconômicas e culturais. Para a maioria dos evangélicos, na América Latina podem ser diferenciados três tipos básicos de conversão: de ruptura futurista, adaptativa e estabilizadora.
A conversão de ruptura futurista ocorre principalmente no início do século xx, com o protestantismo liberal, e em pequenas comunidades, com o protestantismo libertador dos anos 60 e 70. Este tipo de conversão implica em uma ruptura com os universos sociais e simbólicos predominantes para imaginar um mundo melhor, mais livre e igualitário. A conversão adaptativa, por sua vez, acompanha o (limitado) crescimento industrial e urbano na América Latina a partir dos anos 30 do século xx. O catolicismo sacramental e popular não se adapta aos novos requerimentos de força de trabalho urbana. Tanto os setores urbanos pobres quanto os imigrantes rurais rompem com este cosmos sagrado tradicional e encontram em movimentos evangélicos, neocatólicos17 e associações sindicais espaços mais propícios para se adaptarem ao mundo urbano e suas necessidades emocionais, cognitivas e de trabalho. Finalmente, a conversão de estabilização ocorre em meio à crise econômica dos anos 80 e o enfraquecimento dos laços familiares tradicionais. Neste contexto de crise, nem o cosmos católico tradicional nem o cosmos evangélico ascético permitem a reconstrução emocional e social das pessoas. Estas migram para contextos mais emotivos e «pré-racionais», como o pentecostalismo, que lhes permitem se reconstruírem emocional e familiarmente.
Os processos de conversão se relacizinadas estruturas relacionais e simbólicas. As conversões de ruptura futurista tendem a se cristalizar em contextos onde a experiência religiosa é altamente racionalizada. Em algumas ocasiões, como nas comunidades eclesiais de base e nos grupos de reflexão dos anos 60 e 70 associados à Teologia da Libertação, orientam-se para estruturas mais horizontais e pluralistas. As conversões adaptativas tendem a constituir espaços relacionais e simbólicos mais rígidos. O que predomina não é a reflexão coletiva, nem a experiência emocional; a relevância está nas dinâmicas de treinamento e desenvolvimento de habilidades específicas no âmbito da disciplina e do ascetismo. As conversões estabilizadoras se associam de melhor forma a estruturas hierárquicas que proporcionam segurança e com experiências coletivas ou individuais fortemente emotivas de tipo pentecostal.
É a articulação entre processos de conversão e estruturas relacionais de produção de sentido que condiciona em primeira instância a orientação política dos atores religiosos evangélicos. A conversão futurista e as suas estruturas «racionalizantes» se associam de melhor forma a posturas progressistas (protestantismo do início do século xx) ou revolucionárias (Teologia da Libertação dos anos 60 e 70). A conversão adaptativa e as suas estruturas disciplinares tendem a produzir uma orientação política passiva: não questionam o status quo (por exemplo, as ditaduras militares dos anos 60 e 70), mas também não o legitimam religiosamente. Finalmente, a conversão estabilizadora e as suas estruturas hierárquicas se articulam de melhor forma com posições abertamente conservadoras que rejeitam qualquer mudança social que ameace a estabilidade pessoal e familiar alcançada.
Orientação política e discursos ideológicos: o papel das elites evangélicas
Para que a predisposição política resultante do processo de conversão e das estruturas relacionais de produção de sentido se traduza efetivamente em uma posição pública, é necessária sua articulação com determinados discursos teológicos e políticos, produzidos por elites locais e globais. Para que o protestantismo do início do século xx assumisse uma posição progressista, foi necessário o seu contato com o liberalismo político. Para assumir uma posição revolucionária, alguns grupos evangélicos dos anos 60 e 70 assimilaram a Teologia da Libertação, noções da Teoria da Dependência e do marxismo latino-americanos. Para legitimar sua postura comprobatória, grande parte dos evangélicos latino-americanos assimilou, nos anos 60 e 70, um individualismo teológico de caráter fundamentalista proveniente do sul dos Estados Unidos. Para o desenvolvimento de uma posição abertamente conservadora, os grupos «pró-vida» e «pró-família» se articulam hoje com redes globais de organizações nas quais circulam discursos religiosos, legais e bioéticos que legitimam suas posturas.
Geralmente, essa articulação entre predisposição política e discursos teológico-políticos ocorre através de «afinidades eletivas»18. No contexto de uma circulação de vários discursos, aumentada agora pelos meios de massa e pelas redes sociais virtuais, há certa afinidade de alguns deles com as duradouras predisposições dos atores religiosos, fruto das suas dinâmicas de construção de sentido. Há, então, uma atitude seletiva perante os discursos disponíveis. Esta seletividade se traduz em uma articulação real, através da cooperação entre elites produtoras do discurso em escala global (dentro ou fora da América Latina) e em escala local (relacionadas diretamente com os fiéis evangélicos). Para ilustrar o que foi dito, vamos nos concentrar nas elites que produzem e difundem discursos teológicos e políticos referentes à defesa da vida e da família tradicional.
Estes discursos se desenvolveram inicialmente nos eua com a emergência do que hoje é conhecido como «nova direita cristã»19. Essa é a reação diante da «onda progressista» que o país do Norte vivenciou nos anos 60 e início dos anos 70, caracterizada, entre outros aspectos, pela demanda de uma maior autonomia para a mulher e de igualdade de direitos para pessoas lgbti20. Esta nova direita cristã é formada pela constelação de telepregadores, universidades evangélicas, associações civis e instituições como Foco na Família, Coalizão Americana para os Valores Tradicionais, Americanos Unidos pela Vida, Instituto Guttmacher, Vida Humana Internacional, etc., dedicadas a produzir e fazer circular discursos em «defesa da vida e da família»21.
Já a partir dos anos 70, a direita cristã estadunidense promoveu a circulação do seu discurso na América Latina. Por exemplo, Foco na Família distribuiu semanalmente o seu popular programa de rádio de mesmo nome a mais de 1.200 emissoras de rádio do continente22. O mesmo pode ser dito do popular programa Club 70023. Entretanto, nos anos 80 e 90 este discurso não se articulou significativamente com as elites evangélicas locais, nem foi assumido por grandes setores religiosos. Neste caso, a orientação política dessas elites conservadoras apontava para uma representação confessional própria dos sistemas de partidos políticos, sem um discurso político explícito.
Foi preciso que ocorressem dois fenômenos para que o discurso evangélico estadunidense de «defesa da família tradicional» fosse assumido pelos atores evangélicos conservadores da América Latina. Primeiro, a partir dos anos 80 e 90, houve um aumento na conversão de estabilização que procura «restaurar» a estabilidade familiar perdida durante a crise econômica. Depois, a partir das Conferências da Organização das Nações Unidas sobre População e Desenvolvimento do Cairo (1994) e sobre Mulheres em Pequim (1995), os direitos sexuais e reprodutivos entraram nas agendas legislativas, midiáticas e educacionais da América Latina. Neste contexto, os novos convertidos evangélicos, envolvidos na construção de universos simbólicos orientados a restaurar a família nuclear, heterossexual e baseada na subordinação da mulher, sentiram-se ameaçados pelas mudanças culturais e legislativas relacionadas com os direitos sexuais e reprodutivos e apelaram para uma orientação política a favor do discurso da direita cristã estadunidense.
No início do século xxi, multiplicam-se na América Latina organizações evangélicas «pró-vida» e «pró-família», que têm como objetivo fundamental frear o avanço da «agenda gay» (família homoparental) e da «ideologia de gênero» (descriminalização do aborto) nas legislações de cada país. Estas elites locais evangélicas mantêm uma estreita relação com organizações e líderes da direita cristã dos eua. Durante os primeiros anos deste século, essas organizações se mobilizaram em uma parceria tácita com a hierarquia e com movimentos similares da Igreja católica. Organizaram seminários, workshops, mobilizações sociais, processos legais e atividades de atores políticos, especialmente nos parlamentos. Embora a agenda dos direitos sexuais e reprodutivos ten- ha obtido avanços, as organizações «pró-vida» e «pró-família» também conseguiram suas vitórias.
Na Nicarágua, por exemplo, estes grupos conseguiram que em 2006 fosse anulado o «aborto terapêutico», de modo que o Código Penal atual puna todo tipo de interrupção da gravidez. Em 2000, foi declarada inconstitucional a fecundação in vitro na Costa Rica, o que fez com que o Estado desse país comparecesse em 2012 perante a Corte Interamericana de Direitos Humanos. Em 2000, o 25 de janeiro foi declarado como o Dia do Nascituro na Nicarágua, replicado na República Dominicana (2001), Peru (2002) e Equador (2006). Em 2004, essas organizações «pró-vida» e «pró-família» conseguiram impedir a sanção da Lei-Base Sobre Direitos Sexuais e Direitos Reprodutivos já aprovada pelo Congresso da Bolívia. Em 2006, o Tribunal Constitucional do Equador proibiu a venda da pílula anticoncepcional de emergência, e o mesmo aconteceu no Chile, em 2008, e no Peru, em 200924. Após a descriminalização do aborto no México, df, em 2007, os grupos «próvida» e «pró-família» conseguiram leis restritivas em 17 estados mexicanos. Em 2009, durante a «correção de estilo» da nova Constituição Política do Estado da Bolívia, estes grupos pressionaram para que fosse introduzida de forma ilegal a definição de casamento como sendo a união entre um homem e uma mulher. Em 2012, foi aprovada na República Dominicana a Constituição Política do Estado, que protege a vida humana «desde a concepção»25.
Conclusões
O posicionamento conservador de amplos setores evangélicos na América Latina não depende unicamente da influência das elites locais e globais, que fazem circular discursos teológicos e políticos referentes à mudança social. É necessária uma predisposição para se apropriar destes discursos, predisposição esta que está condicionada por processos de conversão e pela dinâmica de construção de um cosmos sagrado. Como se viu neste artigo, essas dinâmicas de conversão são uma forma de resolução da contradição entre cosmos sagrados tradicionais e novas condições vitais.A conversão estabilizadora predominante no movimento evangélico a partir dos anos 80 se vincula a contextos relacionais religiosos caracterizados pelo predomínio de estruturas hierárquicas tanto na família como nas comunidades de fé. Estas relações hierárquicas permitem que as pessoas reconstruam suas relações familiares afetadas pelas crises e transformações sociais. A família nuclear, heterossexual e baseada em uma subordinação «benigna» das mulheres se torna o núcleo da experiência religiosa de grandes setores evangélicos. Este tipo de construção do cosmos sagrado evangélico das últimas décadas é a base para o desenvolvimento de predisposições contrárias às mudanças sociais e culturais que possam afetar a família tradicional-patriarcal. E é a base para assimilar os discursos «pró-família» e «pró-vida» das elites conservadoras tanto da América Latina quanto da nova direita cristã dos eua.
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1.
Laura Fuentes: «Afirmar la autonomía reproductiva en la disidencia religiosa» em Íconos No 45,
1/2013, pp. 59-74.
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2.
Marcos Carbonelli, Mariela Mosqueira e Karina Felitti: «Religión, sexualidad y política: inter- venciones católicas y evangélicas en torno al aborto y el matrimonio igualitario» em Revista del Centro de Investigación No 36, 7-12/2011, pp. 25-43.
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3.
Carlos Mondragón: «Protestantismo y poder en América Latina. Minorías religiosas, laicismo y cultura política» em Espacios de Diá- logo No 2, 4/2005, pp. 93-114.
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4.
Jean Pierre Bastian: La mutación religiosa de América Latina, Fondo de Cultura Económica, México, df, 1997.
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5.
Jean Pierre Bastian: La mutación religiosa de América Latina, Fondo de Cultura Económica, México, df, 1997.
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6.
A partir de 1930, a expansão urbana na América Latina se acelerou. De 1940 a 1960, a população urbana aumentou de 33% para 44%. Em 1990, a proporção chegou a 72%. Ver Alan Gilbert: «El proceso de urbanización» em Gregorio Weinberg (dir.): Historia general de América Latina vol. 8, unesco / Trotta, Paris -Madri, 2008, pp. 129-149.
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7.
e até a crise de 1930 o movimento evangé- lico era minúsculo na maioria dos países da América Latina, a partir das mudanças sociais geradas por essa recessão ocorre um cresci- mento exponencial de agrupamentos evangé- licos. De menos de 2% da população, passam a ser, em 2013, de 5% (no Paraguai) a 40% (na Guatemala), com porcentagens significativas em grande parte da América Central (de 30% a 40%) e em alguns países da América do Sul, como o Chile (25%) e o Brasil (21%). Trata-se de um crescimento paralelo à constante di- minuição de católicos, que, de mais de 95% antes de 1930, diminuíram em 2013 para 67% da população, em um continente tradicional- mente considerado «católico». Corporación Latinobarómetro: Las religiones en tiempos del papa Francisco, Corporación Latinobarómetro, Santiago do Chile, 16 de abril de 2014.
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8.
David Martin: «Otro tipo de revolución cultural. El protestantismo radical en Lati- noamérica» em Estudios Públicos No 44, primave- ra de 1991, pp. 39-62. O movimento pentecostal é a expressão majoritária entre as comunidades evangélicas na América Latina. É caracteri- zado por uma espiritualidade fundamental- mente emotiva, com experiências extáticas durante o culto (dom de línguas, curas mi- lagrosas, danças etc.) e por sua cultura com predomínio da oralidade, que lhe permite se adaptar aos diferentes contextos sociocultu- rais do continente.
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9.
Em seu clássico estudo sobre o pentecos- talismo chileno, Christian Lalive d’Epinay denomina esta postura política como «greve social». C. Lalive d’Epinay: El refugio de las masas. Estudio sociológico del protestantismo chileno, Editorial del Pacífico, Santiago do Chile, 1968.
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11.
Heinrich Schäfer: «La generación del sen- tido religioso: Observaciones acerca de la di- versidad pentecostal en América Latina» em Daniel Chiquete e Luis Orellana (eds.): Voces del pentecostalismo latinoamericano iii: teología, historia, identidad, emw / cetela, Santiago do Chile, 2009, pp. 45-72.
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12.
J.P. Bastian: «Pluralización religiosa, laici- dad del Estado y proceso democrático en América Latina» em Historia y Grafía No 29, 2007, pp. 167-194.
-
14.
Juan Marco Vaggione: «Sexualidad, reli- gión y política en América Latina», trabalho apresentado no Diálogo Latino-americano so- bre Sexualidade e Geopolítica, Rio de Janeiro, 24 a 26 de agosto de 2009.
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15.
P. Berger: «Las religiones en la era de la globalización» em Iglesia Viva No 218, 4-6/2004, pp. 63-86; e El dosel sagrado. Para una teoría sociológica de la religión, 2a ed., Amorrortu, Buenos Aires, 1969.
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17.
Como a Juventude Operária Católica, a Ação Católica, o Movimento Neocatecumenal, o Movimento Carismático, a Juventude Cató- lica Universitária, etc., incluindo as próprias comunidades eclesiais de base.
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18.
Sobre o conceito de afinidade eletiva apli- cado à sociologia da religião, v. Michael Lowy: Guerra de dioses. Religión y política en América Latina, Siglo xxi, México, df, 1999.
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19.
Juan Maldonado: «Política y religión en la derecha cristiana de los eeuu», documento de trabalho do Departamento de Ciências Polí- ticas da Universidad Complutense de Madri, junho de 2007, s/e.
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20.
Lésbicas, gays, bissexuais, transexuais/ transgênero, intersexuais.
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21.
Edgar González e Carlos Monsiváis: La sexualidad prohibida: intolerancia, sexismo y repre- sión, Plaza & Janés, México, df, 2002. É neces- sário mencionar aqui instituições dedicadas à «terapia de homossexuais», como Exudus International, que após 37 anos de existência em 2013 colocou fim às suas atividades pedindo perdão aos milhares de homossexuais que submeteu às suas terapias, reconhecendo que a homossexualidade é uma condição e não uma doença.
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22.
Em 2005, Foco na Família contava com um orçamento anual de 142 milhões de dólares, com mais de 1.200 empregados somente nos eua e atividades em mais de 80 países. E. González: Cruces y sombras. Perfiles del con- servadurismo en América Latina, 2005, inédito, disponível em <http://promsex.org/images/ docs/Publicaciones/Cruces_y_Sombras.pdf>.
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23.
D. Stoll: op. cit.
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24.
Em 2013, o Ministério da Saúde do Equa- dor decidiu distribuir esse anticoncepcional. «O Ministério da Saúde do Equador entregará a pílula do dia seguinte de forma gratuita» em El Universo, 26/3/2013.
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25.
Ramón Torre Cañal: «Agenda contra los de- rechos sexuales y derechos reproductivos: las democracias latinoamericanas bajo amenaza», s.d., disponível em <http://nosotrasdecidimos. org/agenda-contra-los-derechos-sexuales-y- derechos-reproductivoslas-democracias- latinoamericanas-bajo-amenaza/>.